segunda-feira, 4 de julho de 2011

Se senador está sendo denunciado, não há porque temer denunciar políticos desonestos

STF aceita denúncia contra senador Cícero Lucena

Por votação unânime, o Plenário do Supremo Tribunal Federal recebeu parcialmente, nesta quinta-feira (30/6), denúncia do Ministério Publico Federal contra o senador Cícero Lucena Filho (PMDB-PB), por acusação de fraudes em licitações de obras conveniadas entre a prefeitura de João Pessoa e órgãos do governo federal, no período em que ele foi prefeito, em duas gestões (1997 a 2004).
Com esta decisão, tomada pela Suprema Corte em Inquérito, o senador passa agora a figurar como réu em Ação Penal, na qual poderá exercer amplamente seu direito ao contraditório e à ampla defesa.
A ministra Ellen Gracie lembrou que é relatora de duas ações envolvendo o mesmo senador. A primeira é a Ação Penal 493, já em fase final de conclusão, em que Lucena é acusado de ofensa ao artigo 89 da Lei 8.666 (dispensa ilegal ou não exigência de licitação ou não obediência às normas legais de licitação), e o Inquérito 3.009, por ofensa ao artigo 1º, inciso I, do Decreto-Lei 201 (crime de responsabilidade contra prefeito, por apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio).
Ellen Gracie observou que, para receber uma denúncia, basta que haja indícios fortes de materialidade e autoria e que ela só deve ser rejeitada quando forem perceptíveis a patente atipicidade da conduta e falta de justa causa. Esta — alegada pela defesa do senador — deve ser provada de plano, o que a ministra não considerou ser o caso nesse inquérito. "No presente caso, tenho que os indícios colhidos na fase de investigação, aliados ao exame da prova documental que está encartada nos autos, autorizam o recebimento parcial da denúncia", afirmou a ministra.
Contratos antigos
Conforme consta do relatório feito pela ministra, relatora do caso, a base da denúncia contra o então prefeito é a dispensa de licitação, em ofensa à Lei de Licitações (Lei 8.666/1993); superfaturamento de obras; pagamento de serviços e obras não realizadas; e, ainda, formação de quadrilha, da qual ele seria o chefe, por acusação de ter ordenado — sobretudo a secretários municipais — o cometimento das irregularidades denunciadas.
Da denúncia consta que o então prefeito determinava o aproveitamento de contratos antigos para execução de contratos e convênios de repasse de recursos firmados com o governo federal no fim dos anos 90 e início dos anos 2000, embora tais contratos já estivessem vencidos e tivessem objetos incompatíveis com os contratos firmados por Lucena com o governo federal.
E tais contratos, conforme ainda a denúncia, nem eram, em regra, realizados diretamente pelas antigas vencedoras de contratos, mas cedidos para empresas indicadas pelo então prefeito. Segundo o MP, havia aditivos aumentando a quantidade dos serviços ou obras, ou simplesmente reajustando os preços.
Também teria havido a prática de sobrepreço e o pagamento de obras e serviços não realizados, sendo que fiscais da Secretaria de Infraestrutura (Seinfra) teriam certificado falsamente sua realização ou conclusão. As denúncias envolvem 13 convênios e contratos administrativos de repasse de verbas federais, no valor de mais de R$ 45 milhões. Conforme o MP, as fraudes foram confirmadas em investigação feita pela Polícia Federal e admitidas por ex-secretários da prefeitura de João Pessoa, na época em que Lucena Filho era prefeito.
Prescrição e denúncia vazia
Para a ministra Ellen Gracie, os crimes referentes a algumas das acusações feitas ao senador já estão prescritos. Relativamente a um contrato firmado em 2000, aproveitando convênio anterior com prazo já vencido e objeto diverso, bem como um contrato anterior, de 1999, ela considerou prescrito o crime previsto pelo artigo 288 do Código Penal (formação de quadrilha ou bando para o cometimento de crime), porquanto esse crime prescreve em 8 anos.
Em relação a este mesmo convênio, de número 91/2000, segundo a ministra relatora, só deve ser aceita a denúncia no que enquadra o então prefeito no crime previsto no artigo 1º, inciso I, do Decreto-Lei 201/67, que sujeita o prefeito a ser processado por crime de responsabilidade, independentemente de prévia licença da respectiva câmara municipal, pelo crime de "apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio".
Ainda quanto ao convênio 91/2000, ela considerou que a defesa postulou, com razão, a falta de justa causa no que tange ao enquadramento do então prefeito no artigo 96, inciso V, da Lei 8.666 (tornar, por qualquer modo, injustamente, mais onerosa a proposta ou a execução do contrato). Segundo a ministra, a denúncia é genérica neste aspecto, e não narrou em minúcias o suposto crime do então prefeito.
Em relação ao contrato 132/872–25, que vigorou de 31.12.01 a 30.12.2004, prescreveu, em relação a ele, segundo a ministra, a imputação do crime capitulado no artigo 93 da Lei 8.666, “permanecendo os demais delitos com plena viabilidade de persecução penal”. O mesmo se aplica a outros convênios.
Nesta mesma linha, ela também excluiu, por prescrição, a incidência do artigo 93 dos demais contratos abaixo relacionados, com vigência variada, no período entre 2000 e 2004 (ver abaixo um resumo das decisões sobre cada convênio).
A ministra repetiu o argumento da defesa de que, em vez do enquadramento do então prefeito no artigo 89 da Lei 8.666, a denúncia deveria ter sido feita por violação ao parágrafo único do mesmo artigo (quem concorreu para o crime), porquanto o então prefeito poderia, quando muito, ser enquadrado como mero partícipe.
Ela contra-argumentou que, em crime em concurso, é possível o agente não participar da execução, mas comandar a ação criminosa dos demais participantes.
A ministra refutou, também, o argumento de violação do princípio do juiz natural por ter desembargador do Tribunal Regional Federal da 5ª Região autorizado a continuação de escutas telefônicas pelas quais o então prefeito foi investigado, inicialmente autorizadas por juiz de primeiro grau.
Segundo ela, o processo foi transferido da Justiça de primeiro grau, onde o processo foi iniciado, para o TRF, em virtude de prerrogativa de foro. Portanto, o relator do processo no TRF passou a ser o juiz natural.

Com Informações da Assessoria de Imprensa do STF.

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